quarta-feira, julho 27, 2005

DIACONO HENRIQUE E OS SANTOS NEGROS


Na no dia 4 de junho foi sepultado no Cemitério Municipal, o diácono Henrique Alberto da Silva Junior, ou Seu Henrique, como era conhecido. Sua figura no altar da Igreja Matriz de São João Batista, nas missas e procissões me faz recordar tantos são os santos negros da Igreja Católica e poucos são divulgados ou conhecidos.
Numa rápida pesquisa descobri cinqüenta e um santos e confesso, só conhecia 10%. Só Nossas Senhoras são nomes: Aparecida, Caminho, Croácia, Montserrat, Rosário, Fourvieri e D`Oropa. Há ainda a devoção brasileira a São Benedito e Santa Efigênia, conseqüência das Irmandades Negras, criadas na vigência da escravidão, frutos da segregação étnica que existia.
A África gerou santos como São Benedito, nascido em 1526, descendente de etíopes cativos em Filadelfo, região da Sicília, na Itália. É conhecido na Europa como Santo Mouro – por semelhança da cor de pele com os árabes que ocuparam a região. De analfabeto chegou a chegou a Superior do Monastério Franciscano de Monte Pellegrino. Teve uma vida inspirada em São Francisco de Assis, e antes de morrer em 1589, pede para ser enterrado como simples frade.
Santa Efigênia era filha de um rei da Etiópia, que foram convertidos ao cristianismo por São Mateus, que acabou morto por um nobre que desejava casar com a princesa. Ela entristecida doou seus bens materiais e construiu um Santuário em homenagem ao Santo, permanecendo virgem até sua morte.
Outra africana que virou santa foi Josephina Bakhita, nascida em 1868, em Oglassa, Darfur, Sudão. Filha de uma rica família é seqüestrada com apenas 9 anos, por mercadores de escravos. Vendida a uma família italiana, torna-se católica aos 22 anos e morre no dia 8 de fevereiro de 1947, como freira do Instituto das Irmãs de Caridade, sendo canonizada como padroeira do Sudão, no ano 2000 pelo Papa João Paulo II.
Há ainda a historia de a Escrava Anastácia, não canonizada, mas considerada santa por seus milhões de devotos no país. Há quem diga que ela nunca existiu e seu mito surgido em 1968.
A maior devoção do Diácono Henrique sem duvida era de Nossa Senhora Aparecida, a quem dedicada todo ano à organização de romarias ao Santuário, localizado no Vale do Paraíba. A fé na Padroeira do Brasil, nasceu em 1717, quando os pescadores Domingos Garcia, Felipe Pedroso e João Alves retiraram do Rio Paraíba, uma imagem de uma santa negra enegrecida. Ainda há São Gelário, o Papa Negro de 492 a 496 – durante o difícil período das tensões entre Roma e Constantinopla.
A Igreja Católica tem inclusive uma Pastoral Afro, ligada a CNBB- Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil, que trabalha com a comunidade negra católica, usando elementos da cultura nas celebrações, nas conhecidas missas afros, que já acontecem em Bebedouro.
A figura exemplar de Seu Henrique deixa nas paróquias os padres afro brasileiros que bem o representarão: Adão e Sinval. E ele tinha consciência negra, não manifestada em discursos, panfletos e passeatas, mas na sua postura pessoal de ser um cidadão e religioso.
Maiores informações sobre santos negros podem ser obtidas no site www.santaluzialimeira.com.br.

A GRANDE FAMILIA REBOUÇAS





Um recente email me motivou a escrever sobre a Família Rebouças. Não tinha feito antes por acreditar que essa historia fosse até mais conhecida que a de outras personalidades negras. Infelizmente não, pois são nomes de vias publicas, sem a devida explicação didática.
A Historia dos Rebouças começa ainda no período de escravidão negra. Especificamente no estado da Bahia, com o feliz, mas humilde casal Gaspar Pereira Rebouças e Rita Basília dos Santos. Ele um comerciante e ela uma dona de casa. Desse matrimonio nasceram os meninos José, Manuel e Antônio.
Ao crescerem os filhos optaram cada por um caminho profissional. O primogênito – José tornou-se uma excelente violinista e compositor, conseguindo inclusive excursionar pela Europa. O filho do meio – Manuel Mauricio optou no inicio por uma carreira no serviço publico exercendo a função de escrevente de Cartório na cidade baiana de Jaguaripe. Mas depois resolveu estudar na França, de onde retornou ao Brasil com o titulo de bacharel em ciências e doutor em medicina. Fez sucesso como professor de botânica e zoologia na Escola de Medicina da Bahia. Virou Cavaleiro da Ordem de Cruzeiro ao combater a epidemia da febre amarela e cólera no século XVIII.
Antonio Pereira Rebouças – o caçula optou pela política, tendo se tornado um deputado, representando o estado da Bahia, por 43 anos. Foi autor de uma lei em 1837 proibindo o tráfico de escravos em território nacional e chegou a receber o titulo de Conselheiro do Império do Brasil. Morreu em 1880. Mas entre seus oito filhos se destacam dois André e Antonio Rebouças.
Os meninos estudaram e se tornaram Bacharéis e Ciências e Matemática, engenheiros e se especializaram na França. Antonio se tornou especialista em construção de estradas, sendo inclusive responsável pela construção da estrada de Graciosa de Antonina e Curitiba. Viajou ainda pela Colômbia e outros países da América Latina como secretario diplomático. Assumiu no estado do Paraná a função de engenheiro-chefe, tornando-se responsável pela estrada de Curitiba a Guarapuava e baixo Ivaí. No estado de São Paulo foi supervisionou a construção da estrada Campinas, Limeira, Rio Claro. Mas devido à carga excessiva de trabalho, aos 35 anos de idade, Antonio morreu quando fazia estudos para a construção de uma ponte sobre o rio Piracicaba.
André se tornou professor da escola Politécnica no Rio de Janeiro e construiu as primeiras docas dos portos do Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Maranhão e Bahia. Foi ainda responsável por projetos governamentais para sistemas de abastecimento de água para populações urbanas. André é ainda reconhecido como um especialista e mecânica de solo e na utilização do cimento Portland.
Mas o lado mais conhecido de André foi sua participação no Movimento Abolicionista ao lado de figuras como Joaquim Nabuco e Rui Barbosa. Como jornalista militante contra escravidão teve artigos publicados nos jornais: Gazeta de Noticias, Jornal do Commercio e Gazeta da Tarde.
Era tido como ótimo articulador político e era um dos defensores da reforma agrária brasileira, mas destinadas aos negros a serem libertados e aos já alforriados como forma de evitar que fosse para a miséria.
A tão sonhada Abolição aconteceu em 1888, mas por sua opção monarquista, teve problemas políticos e acabou se auto exilando junto com a família real e Dom Pedro II na França. E não demorou a se empreender em mais uma luta – passou seus últimos seis anos de vida na tentativa de desenvolvimento urbano de alguns paises africanos.
Num fato pouco explicado André Rebouças, aos 60 anos, faleceu aparentemente afogado na Ilha da Madeira. Há quem diga que tenha sofrido um acidente e outros argumentam que foi suicídio, apesar de não ter deixado carta alguma.
André Rebouças foi ainda oficial engenheiro durante a Guerra do Paraguai. Nasceu em Cachoeira, estado da Bahia, em 1838.

quarta-feira, julho 20, 2005

AFRICA: PAÍSES ARTIFICIAIS




“África una-te, porque temos que sair da babilônia e estamos indo para terra de nosso pai./Como seria bom e agradável antes do Deus e do homem,
ver a unificação de todos os africanos como já deveríamos ter feito...”.
AFRICA UNITE (tradução)
Bob Marley

Quando a Coroa Portuguesa começou em 1444 o processo de seqüestro e venda de habitantes da Nigéria, foi só o começo de uma interferência externa em nações africanas. E é bom identificar que a imagens dos paises no continente africano, é fruto de uma divisão artificial, sem consulta as diversas nações existentes.
Após o esgotamento do modelo de escravidão e exploração da África, os europeus passaram retirar do continente, minérios preciosos. Mas resolveram durante a Conferencia de Berlim, entre novembro de 1884 a fevereiro de 1885 fizeram um esboço da ocupação territorial pelas nações imperiais. Beneficiados por esse acordo foram Inglaterra, Holanda, Itália, Bélgica, Alemanha, Espanha e Portugal.
Desse acordo surgiram muitos países que hoje conhecemos no mapa da África. Mas nações e até famílias forma obrigadas a separação devido o estabelecimento de fronteiras territoriais. E a proibição impediu inclusive que uma tribo pudesse plantar em áreas férteis, como antes fazia. Por isso é comum hoje vermos guerras tribais, nas regiões fronteiriças – pois elas não são reconhecidas pelo povo africano. Um exemplo europeu disso foi à dissolução da Iugoslávia em vários paises, pois eram unidos a força.
Além da fixação autoritária de países, os impérios coloniais sufocavam as inspirações de autodeterminação das nações africanas. Havia desde o inicio da colonização movimento de independência e libertação desses países. Com as primeira e segunda guerras mundiais houve um enfraquecimento militar dos europeus e o fortalecimento da consciência africana – sintetizado no pan-africanismo.
Mas isso não foi um processo pacifico. No Quênia, entre os anos de 1952 a 56 - membros da etnia kikuyus se revoltaram contra os colonizadores. O mesmo aconteceu em Camarões entre 1955 a 1958. Mas a partir da década de 60, isso se organizou e varias nações tornaram-se independente.
Mas A Guerra Fria, na disputa entre Estados Unidos e União Soviética, contaminou as relações já tensas entre alguns povos africanos e com o fornecimento de armas interesseiro de americanos, chineses, soviéticos e britânicos – o continente foi mergulhado em conflitos armados que até agora não cessaram. Eles alimentam a discórdia – em estratégia semelhante da época da escravidão – dando armas para nações se massacrarem. A vencedora dessa maléfica lógica deve favores aos fornecedores.
Um ponto positivo foi à união de lideranças africanas na tentativa de unificação das ações, pois recém libertados – os países tinham problemas comuns. Em 1963 foi criada a Organização da Unidade Africana – OUA. Mas as divergências entre países africanos de orientação mulçumana e outros de aspirações ocidentais, dificultam essa convergência de interesses.
Um outro grande problema para África é o aparecimento da AIDS que vem dizimando gerações inteiras, retirando do processo de desenvolvimento a força de trabalho necessária. Há quem preveja que se uma política de saúde igual a do Brasil não for adotada, em alguns anos 40% dessas populações serão contaminadas. Mas há inclusive chefe de nações que se recusam gastar verba com medicamentos, alegando que eles não são eficientes.
Nesse circulo vicioso de exploração, guerras e tragédias, a África nunca se desenvolve como deveria. Com exceção de alguns paises como África do Sul. A iniciativa do G8 – Grupo formado pelos países mais ricos e poderosos do mundo – em cancelar a Divida Externa de várias nações africanas é uma boa atitude. Elas não têm condições de pagamento, mas é necessário que os lideres dessas nações redirecione o dinheiro para melhorias sociais. O que pode ser difícil, pois assim, como em qualquer país – a corrupção também existe.

CRONOLOGIA DA INDEPENDENCIA DA AFRICA
1846
Independência da Libéria

1957
Gana é o primeiro país da África Negra a tornar-se independente

1958
Independência da Guiné

1960
Independência do Congo
Independência da Costa do Marfim
Independência do Gabão
Independência do Mali
Independência do Niger
Independência da Nigéria
Independência do Senegal
Independência da Somália
Independência do Zaire

1961
Independência de Serra Leoa

1962
Independência da Argélia
Independência de Burundi

1963
Independência do Quênia

1973
Independência da Guiné-Bissau

1975
Independência de Angola
Independência do Benin
Independência de Cabo Verde
Independência da Etiópia
Independência de Moçambique
Independência de São Tomé e Príncipe

1980
Independência do Zimbábue

1990
Independência da Namíbia

quinta-feira, julho 14, 2005

SIMONAL – PRIMEIRO IDOLO BLACK DO BRASIL



Meu limão, meu limoeiro
Meu pé de jacarandá
Uma vez skindô lelê,
outra vez, skindô lalá





O Brasil que hoje assiste e aplaude Netinha de Paula como apresentador de TV, pouco se lembra que nos anos 60 teve um artista negro também famoso e muito injustiçado em seu fim de vida: Wilson Simonal. Ele foi o primeiro ídolo negro com consciência negra e antenado com o Movimento Black Power que ocorria nos Estados Unidos.
Simonal nasceu no mês de fevereiro, em 1938, no dia 23 – quarta-feira de cinzas. Cidade: Rio de Janeiro. Seu nome verdadeiro é Wilson Simonal de Castro. O pai era um radiotécnico que abandonou a esposa, uma simples cozinheira, Simonal e seu irmão José Roberto.
A infância de Simonal foi difícil. A mãe trabalhando em casas de ricas famílias da zona sul do Rio alimentava os filhos com restos das refeições delas. Mas houve uma época que até isso secou e ela foi obrigada a deixar os meninos em colégio interno – onde teriam comida e estudo garantidos.
Mesmo assim, desde menino alimentava sonho de se tornar um artista. E a primeira oportunidade que apareceu, ele não jogou fora: programa clube do Rock, na extinta TV Continental, apresentado por Carlos Imperial. Mesmo com duas horas de atraso, conseguiu comover Imperial, que tornou Simonal seu secretário. Juntos vieram criar um estilo musical que o consagrou: a “pilantragem”.
E para homenagear sua namorada, Teresa Pugliesi, compôs a musica que viria a ser seu primeiro sucesso gravado – “Teresinha”, feita em parceria com Imperial. Além de virar hit, a canção conquistou de vez o coração da amada e eles casaram. Frutos desse casamento são os músicos Max de Castro, Simoninha e única menina – Patrícia.
Outra parceria que lhe impulsionou a carreira foi com a dupla Carlos Miéli e Ronaldo Bôscoli, que produziram seu famoso show no Maracanãzinho, que lotou com mais de 30 mil pessoas cantando suas musicas. A partir daí estouraram convites para participar de festivais nacionais e internacionais.
Até que surgiu a proposta de apresentar um programa de televisão. O canal era a extinta TV Tupi, e o programa de nome “Spotlight”. Foi um tremendo sucesso, que logo foi oferecida uma outra chance. Foi na TV Record e com um programa só seu e com seu nome: “Si Monal”.
Tanto na TV, quanto nos shows, Simonal conseguiu um feito para época – conseguiu patrocinadores sensacionais e de multinacionais. Entre eles a Rhodia e a Shell. Era enfim um símbolo sexual e um ícone negro. Cantava musicas em homenagem a Martin Luther King e exaltação ao orgulho e a beleza afro brasileira. Canções como “Meu Limão, Meu Limoeiro”, “Patropi”.
Mas em 1971 a carreira de Simonal foi destruída. Desconfiado da atuação de seu contador, suspeito de desviar dinheiro, o cantor o demite. O ex-funcionário se vinga acusando sem prova de ser um informante do Serviço Nacional de Informação – SNI. O fato vai para o jornal de oposição ao Regime Militar – o Pasquim, sem ser devidamente checado. E ainda foi jogada nas costas de Simonal a fama de delator de outros músicos, simpáticos à esquerda.
Mesmo que falando o contrario, o clima político da época não deu tempo para que pudesse se defender e não demorou que as portas se fechassem. Ele ainda conseguiu na Redemocratização do país, ter acesso a documentos oficiais através de um “Hábeas Data” que provava que ele nunca tinha colaborado com os ditadores. Percorreu as redações dos jornais solicitando o mesmo espaço que foi usado para difamá-lo para se retratar. Poucos o atenderam.
Há pouco tempo atrás, o jornal Folha de São Paulo, fez uma reportagem comprovando que Simonal dizia a verdade, mas foi tarde. O ídolo negro morreu em 2000, no dia 25 de junho. No atestado de óbito consta que a causa morte foram derivados a cirrose. Mas seus familiares justificam que ele morreu mesmo foi de desgosto

Nem vem que não tem
Pra virar cinza minha brasa demora!
Michô meu papo, mas já vamos'imbora!
Eu nesse embalo vou botar pra quebrar
Sacudim, sacundá, sacundim, gundim, gundá

SABOTAGE – O RAP É COMPROMISSO


Filho de mãe solteira, crescendo na periferia de São Paulo, Mauro Matheus dos Santos teve apenas 29 anos de vida para provar seu talento. Em janeiro de 2003, foi assassinado, mas a lenda do Canão Sobrevive!
Sabotage nasceu Mauro, com tios envolvidos no trafico de drogas na favela do Buraco Quente, na Zona Sul paulistana. Nesse ambiente foi logo engajado no movimento e como criança, ele e seus irmãos, eram “aviões” dos irmãos da mãe, entregando as drogas.
Não demorou o pequeno Mauro foi encaminhado para a Febem, numa ação policial e depois como adolescente foi detido, sendo inclusive torturado para delatar os tios. Aos 21 anos de idade foi detido duas vezes por porte e tráfico de drogas.
No mesmo tempo que sua vida complicava no trafico, Sabotage foi participando da cena do Rap. Era considerado e respeitado por seu estilo e letras. Com muita fama, obtida na periferia, foi logo chamado a fazer participações em trabalhos de Thaide & DJ Hum, SP Funk e Ataques Versos. Outra estratégia dele foi fazer aparições ao vivo em programas de radio, entre eles, destacamos o Movimento de Rua na FM Imprensa.
Atento aos novos talentos, Ice Blue e Mano Brown – integrantes do Racionais MCs e encaminhou o rapaz para fazer parceiras com a dupla Helião e Sandrão do RZO. Observado a competência vocal de Sabotage, Brown lançou pelo selo Cosa Nostra – controlado pelo Racionais – do primeiro CD solo do rapper: O Rap é Compromisso. Mas o rompimento do grupo com a Sony Music que distribuía os CDs fez com que Sabotage fosse prejudicado.
Nesse meio tempo, Chorão – vocalista do grupo Charlie Brown Junior chamou Sabotage para participar do CD “Nadando com os Tubarões”, em 2000. A Faixa escolhida foi “A Banca”. Ficou tão boa à participação que Chorão retribuiu no CD de Sabotage na musica – “Cantando pro Santo”.
Mas o sucesso de Sabotage acabou acontecendo com os ouvintes de rádios comunitárias. A musica “O Rap é Compromisso” entrou entre as mais pedidas.
Entretanto isso era pouco. Um cineasta paulista rodando as favelas em São Paulo através de locações para seu novo filme, acabou conhecendo Sabotage. Era Beto Brant, que estava começando a rodar o filme “O Invasor”. Os dois se encontraram na Favela do Canão e dessa amizade acabou nascendo um personagem para o rapper, que contracenou com o titã e ator Paulo Miklos e os globais Marcos Ricca e Alexandre Borges. Ele... interpretava assim mesmo nas telas.
Ainda no Filme “O Invasor” – a trilha sonora teve a participação do rapper em cinco faixas, que acabou levando premiações nos festivais de cinema em Brasília e Recife.
Brant gostou tanto da atuação de Sabotage, que se beneficiou do sucesso do rapper, que retribuiu dirigindo seu primeiro clipe – “Um Bom Lugar” – ambientado dentro da Favela do Canão, que imediatamente virou hit após a veiculação na MTV Brasil.
Outro cineasta antenado com as novidades era Hector Babenco – argentino, radicado no Brasil, que estava formando o elenco do filme “Carandiru”. Ao ver nas telas Sabotage, o convidou para participar. Outro sucesso. Se bem que o ator Rodrigo Santoro vivendo um homossexual também deu repercussão.
Mas Sabotage não se iludiu com o mundo das estrelas e continuou freneticamente trabalhando: participa do CD do grupo Instituto – Coleção Nacional, nas faixas Cabeça de Nego e o Dona Tereza – está ultima numa fina inspiração em Jacob do bandolim.
Se estivesse continuado vivo, Sabotage teria se tornado um grande nome do Rap, ao Lado de Racionais e Thaide. Mas as 5h50 da madrugada de 24 de janeiro de 2003, num ponto de ônibus no bairro Bosque da Saúde - Zona Sul da Capital. Tinha acabado de deixar a companheira, Dalva, no serviço. Levou três tiros que acertaram a coluna cervical, um ouvido e a boca.
As testemunhas do crime, ainda tentaram socorre-lo, o levando para o Hospital São Paulo, mas mesmo com ação dos médicos no Pronto Socorro, ele morreu.
Há um CD praticamente pronto a ser lançado. Mas já se passaram 2 anos, mas sua participação em CDs do RZO, B. Negão e outros já puderam ser conferidas e dão à certeza que a sociedade perdeu um cidadão, mas o Rap perdeu o sue diferencial.

CAROLINA DE JESUS – NEGRA DRAMA

NEGRO DRAMA
“Entre o sucesso, e a lama,
Dinheiro, problemas,
“Inveja, luxo, fama...”
Racionais Mc's - Negro Drama


O cineasta afro-brasileiro Jéferson De, acabou há alguns anos dirigindo a excelente atriz Zezé Motta no filme Carolina. Tenho praticamente certeza que 90% das pessoas que estão lendo este texto, não tiveram acesso à obra e, portanto nem sabe de quem o roteiro deve estar falando. É sobre Carolina Maria de Jesus, escritora do livro autobiográfico “Quarto de Despejo” – traduzido em 13 idiomas. Apesar da fama, ela morreu na mesma pobreza que narrava.
A historia de Carolina de Jesus começa lá no interior do estado de Minas Gerais. Especificamente no dia 14 de março de 1914, na cidade de Sacramento. Neta de escravos, sobre o pai apenas se refere como um tocador de violão, mas que não gostava de trabalhar. A mãe, uma lavadeira criou a família e ganhou sua admiração.
Devido os préstimos de sua mãe, Carolina conseguiu estudar no Colégio Alan Kardec, em Sacramento, com bolsa cedida por Maria Leite Monteiro de Barros – uma das freguesas de sua genitora. Mas pode apenas fazer a primeira e segunda série do Ensino Fundamental.
Atrás de oportunidade de emprego, a família mudou-se para Lageado, município próximo a Uberaba, mas quatro anos depois retornam para Sacramento. Em 1930, a família de Carolina vem para o estado de São Paulo, se instalando na cidade de Franca, forte na produção de café e sapatos.
Em 1937, aos 23 anos, Carolina, perde a mãe e também o único vinculo que a mantinha em Franca e parte para capital do estado, atrás de melhores chances de emprego. Chega à terra da garoa, no dia 31 de janeiro.
Entre empregos informais e trabalhos domésticos, a futura escritora, começa a sonhar com o mundo das letras. Num ato de coragem, vai sozinha, a redação do jornal “A Folha”, na Rua do Carmo. No dia 24 de fevereiro de 1941, tem sua foto junto com um poema em louvor a Getulio Vargas é publicado.
Enviando regularmente poemas para o jornal, Carolina é apelidada de poetisa negra, com admiração dos leitores, pela qualidade do texto.
Mas sua grande chance acontece somente em 1958, quase que por acaso. O repórter do jornal Folha da Noite, Adálio Dantas é designado para fazer uma matéria sobre a favela do Canindé. Entre as casas visitadas, o jornalista se depara com a intelectualidade de Carolina, no meio daquela miséria, e ela mostra seus textos a ele. É seu diário, que viria a ser chamado no futuro em publicação de “Quarto de Despejo”. O jovem repórter fica maravilhado com a leitura. No dia 19 de maio, o jornal publica parte do texto, sendo elogiado.
Em 1959, a grande revista da época – O Cruzeiro, também se interessa pelos textos e publicas trechos, mas somente em 1960, com uma tiragem inicial de 10 mil exemplares é publicada a obra: “Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada”.
Somente na noite de autógrafos, Carolina consegue vender 600 exemplares e no fim do ano atinge a cifra de 100 mil cópias. Ela atinge o apogeu, com sua foto estampada na Revista “Negro”, do Circulo Negro. A Academia Paulista de Letras e a Academia de Letras da Faculdade de Direito Largo São Francisco, lhe prestam homenagens.
Com base no sucesso do livro “Quarto de Despejo” ela ainda viaja pelas cidades de Pelotas, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Caruaru e Recife. Até uma peça de teatro, baseada no livro é encenada no Teatro bela Vista, em São Paulo, adaptada por Amir Hadad.
Movido por esse sucesso, Carolina publica no ano seguinte o livro “Casa de Alvenaria: Diário de uma Ex-Favelada”, com prefácio escrito pelo jornalista que a descobriu: Adálio Dantas, pela Editora Paulo de Azevedo. Sua agenda de lançamento editorial a leva a excursionar pela Argentina e Uruguai.
Ainda em 1961, ela participa da Feira do Livro do Rio de Janeiro, como uma das estrelas, despertando o ciúme de um dos maiores escritores do país: Jorge Amado.
Já 3 anos após seu lançamento, Quarto de Despejo é traduzido para o inglês, sendo publicado nos Estados Unidos, sob o titulo “Child Of the Dark: The Diary of Carolina Maria de Jesus. Também em 62, sai a versão em alemão com o titulo Tagebuch der Armut:Aufzeichnunger einer Brasilianischn Negerin.
Ela lança ainda Pedaços de Fome, pela Editora Áquila, apresentado pelo escritor Eduardo de Oliveira. E Quarto de Despejo é reeditado nos Estados Unidos. Ela ainda consegue publicar o livro Provérbios, em 1965, no mesmo ano tem sua obra traduzida em Cuba.
Apesar de ter um livro como verdadeiro best seller, envolvida em contratos estranhos, Carolina de Jesus não se beneficiou do sucesso, financeiramente, apenas as editoras. Não demorou muito a voltar à condição de miserabilidade, sendo inclusive, em 1964, sendo fotografada pela imprensa como simples catadora de papeis nas ruas de São Paulo.
No mesmo tempo que sua obra é reeditada na Alemanha, muda-se para Parelheiros, então periferia de São Paulo, seno inclusive em 1975, objeto de um documentário para a TV daquele país – intrigado por sua obra, intitulado “Despertar de um Sonho”.
Em 1976, a Edioro compra os direitos da obra Quarto de despejo e novamente a escritora, novamente favelada, não vê a cor do dinheiro. Um ano depois, no dia 13 de fevereiro, ela morre, sendo enterrada sem cerimônia ou pompa. Aos 62 anos de idade, rodeada basicamente pelos três filhos, seu corpo é depositado no Cemitério da Vila Cipó, mais de 40 quilômetros do centro da cidade.
Sua obra, pouco divulgada e estudada, faz o que o Rap com suas letras conseguem hoje – traduzir o olhar da população negra e pobre sobre a realidade. Sem o linguajar intelectual e alienado de escritores que apenas visitam a miséria, sem conhecê-la perfeitamente.
É como canta Mano Brown – Racionais Mcs na letra Negro Drama “Eu Não Li, Eu Não Assisti. Eu Vivo O Negro Drama, Eu Sou O Negro Drama. Eu Sou O Fruto do Negro Drama” Carolina é a Negra Drama, vivenciado a situação e narrando, não copiando ou fingindo o que acontece.
Não é a toa que na Trilha Sonora do Filme sobre ela, que Jéferson De colocou a musica. Até parece que o rapper leu o livro, antes de escrever suas letras. A perversidade que a elite intelectual tratou sua maior obra, que chega a insinuar que Quarto de Despejo é na verdade escrita por Adálio Dantas.
Ela deixou três filhos: João José de Jesus, José Carlos de Jesus e Vera Eunice de Jesus Lima. Não teve um companheiro fixo, mas vários amores. Ela afirmava que era difícil um homem suportar uma mulher que dorme com um lápis e papel nas mãos e a qualquer momento, quer escrever. Para se sustentar foi desde a infância empregada domestica, trabalhando em diversas residências e por fim terminou seus dias como catadora de papel. Só em 1983 a TV brasileira, através da Rede Globo fez um resgate de sua historia na série “Caso Verdade”.
Uma dos fatos que mais incomodavam Carolina no final de vida é compreender como pode ter alcançado o sucesso e tão rápida ser esquecida.
Em 1986 foi publica sua obra póstuma – Diário de Bitita, pela Editora Nova Fronteira, mas que absurdamente foi publicado em primeiro na França, só depois no Brasil.

terça-feira, julho 12, 2005

A história de Pixinguinha



Antes de falar quem foi Pixinguinha, vou contar um episódio que beira o folclórico. Certa vez, Pixinguinha, altas horas da noite retornava para sua casa, quando foi abordado por um grupo de assaltantes. Num lance de candura, conseguiu convencer os bandidos a irem até sua casa, que sua esposa, Dona Bete, prepararia uma refeição para ambos. E assim, foi – chegando a sua residência, acordou a pobre esposa – para produzir jantar. Após saciar os criminosos, ele ainda deu uns trocados para que pudesse pegar um transporte para suas residências, e ainda deu conselhos. Esse era Pixinguinha.
Mas ele nasceu Alfredo da Rocha Vianna Filho, em 1897. Entretanto até nisso há confusão: em 1933, Pixinguinha foi retirar sua primeira certidão de nascimento. Vejam só: aos 36 anos de idade. E lá se registrou com o mesmo nome do pai, esquecendo de colocar o “Filho”. Até no nome da mãe, ele errou – de Raimunda Rocha Vianna, passou a Raimunda Maria da Conceição.
Seu apelido é fruto da junção de outros dois. Sua avó, Dona Edwirges – o chamava de Pizindim- que em banto quer dizer - menino bom. Já os seus amigos na época da infância o apelidaram de Bexiguinha – numa referencia as marcadas no rosto deixadas por varíola – doença que tinha sido acometido. Mistura dos dois – nasceu o Pixinguinha.
Quando criança percebeu cedo seu talento – não era bom de bola, mas era exímio em bolinha de gude e empinar papagaios, mas seu pai – seu Alfredo, flautista foi sua maior influencia. Ele já o imitava copiando o som da flauta em folhas de arvores. O genitor, ainda o encaminhou para aulas de bandolim e cavaquinho – aos 12 anos, mas a paixão do menino bom era pela clarineta de sons agudos. Foi insistindo até que passou finalmente a tocar flauta – inclusive uma do seu pai.
Seu ouvido apurado e talento musical não demoraram a ser notados. Com apenas 14 anos de idade foi contratado para o Conjunto da Concha, na casa de chope da Lara, Rio de Janeiro. O sucesso foi imediato – todos queriam ver e ouvir o mini-flautista. Não demorou e foi contratado para tocar no Ponto, no ABC e no Cassino. As apresentações adentravam a madrugada, mas o menino entusiasmado com a possibilidade de ganhar dinheiro e fazer o que gostava - nem ligava para o cansaço.
O que o jogou de vez no mundo artístico, foi o convite para tocar na orquestra do maestro Pauli Sacramento, no Teatro Rio Branco. Dali ao passou a ser visto por pessoas da alta sociedade que o contratavam para tocar em festas, teatros, clubes e até circos.
Sua carreira passou a ser gravada em disco de altas rotações desde 1911, com o choro “Lata de Leite”. Mas em 1915 um registro chama atenção: é para Casa Falhauber. Com o Choro Carioca, interpretou o tango brasileiro “São João Debaixo DÀGUA” – escrita por seu professor de flauta, Irineu de Almeida.
Participou ainda nessa fase do grupo “Diabos do Céu”.
Com 20 anos de idade, Pixinguinha gravaria as primeiras musicas de sua autoria: Sofres Porque Queres e Rosa – recentemente regravada por Marisa Montes.
Com o talento que tinha o jovem musico percebeu que precisava formar um grupo. Seu parceiro de primeira hora foi Nelson Cavaquinho e criaram o grupo – Os Batutas. O grupo foi bem recebido e em 1921 já eram convidados a ser apresentar no teatro Municipal do Rio de Janeiro – o ponto alto da carreira dos músicos da época.
No ano seguinte um empresário Arnaldo Guinle propôs uma temporada de apresentações em Paris. Os Batutas agradou tanto na capital da França, que acabaram ficando por seis meses. Porém o sucesso e o retorno financeiro não foram suficientes para segurar os desentendimentos internos no grupo, que acabou mudança sua formação. Os Batutas mudou tanto, que restou da formação original apenas Pixinguinha e Donga – cantor do primeiro samba gravado em 1917.
Pixinguinha foi convidado em 1926, a dirigir a orquestra do Teatro Rialto. Foi lá que conheceu a amor de sua vida – Albertina de Souza: uma bela estrela do Teatro de Revista. O encontro não poderia dar em outra coisa – casaram-se. Mas o musico sofreu dois anos depois com o fim definitivo do grupo Os Batutas. Sobrou para ele e Donga formarem a Orquestra “Pixinguinha-Donga” que gravou vários discos pela etiqueta Parlophon.
Nesse ano, 1928, o musica atingiu seu melhor período de produção artística. Foi neste ano que foi composta a canção – Carinhoso, produzida a partir da parceria com o compositor João de Barros. Outra parceria foi com Benedito Lacerda concretizado na musica Ingênuo. Compôs ainda Já Te Digo, Lamento, A Vida é um Buraco. Em 1929, foi contratado pela gravadora RCA Victor, atual BMG, e no ano seguinte compôs Urubu Malandro.
Aos 35 anos, o musico forma o grupo da Velha Guarda e oito anos depois abandona a flauta para optar pelo saxofone. Essa história é explicada por um triste fato: Pixinguinha não conseguia manusear o instrumento antigo, devido a danos físicos que o alcoolismo o estava causando. É a exemplo dos músicos do Jazz, ele estava viciado.
O episodio com as bebidas rendeu um choro “Briguei com Virginia”. Muitos pensaram que fosse uma mulher, antiga paixão. Mas o nome é referencia em nome de uma marca da pinga.
Seus grandes sócios de copo eram Donga e João da Bahiana, que se encontravam quase todos os dias no centro do Rio antigo, no Bar Gouveia, sempre aos fins de tarde. Eles e autodenominavam “nós somos um poema”.
Mas a flauta não foi abandonada – encontrou um parceiro – Benedito Lacerda, flautista que acompanhou em gravações e apresentações. Dessa união surgiram Um a Zero, Sofres Porque Queres, Proezas do Sólon, Oito Batutas, o Gato e o Canário e Ainda me Recordo. Foram quinze anos de musicas que a Musica Popular Brasileira agradece.
Tocou ainda com os cantores Francisco Alves, Chico da Viola, Mario Reis, Silvio Caldas e até Carmem Miranda, sempre com arranjos de sua autoria.
Em 1952, na Igreja de São Geraldo, por ocasião das bodas de pratas com enlace com Dona Betinha, ao chegarem à missa, notou-se que o organista tinha faltado. Não fez de rogado, foi ele mesmo manusear o instrumento e o filho, Alfredinho, ficou do lado da mãe, tomando seu lugar na missa.
Sete anos depois, o prefeito do Rio de Janeiro, Negrão de Lima, homenageou Pixinguinha, dando nome dele a rua onde se localiza sua residência. Mas a placa de inauguração não durou muito – foi furtada por seus amigos, os escritores Sergio Porto – o Stanislaw Ponte Preta e Lucio Rangel.
Anos 60, entram em cena a Bossa Nova e novas amizades. Uma delas é Vinicius de Moraes. Os dois em 1962 escrevem a trilha sonora do filme Sol Sobre a Lama. Vinicius não sabe se trabalha ou passa o dia admirando a forma de produzir melodias do mestre Pixinguinha. Na musica Lamento, o poetinha coloca a letra e nos dá uma ótima composição.
Dois anos depois o coração do musico fraquejou – teve um enfarte. Internado ele compõe 20 musicas. Entre elas: Solidão, Mais Quinze Dias, Harmonia das Flores, No Elevador, mais Três, e Vou para Casa. Nessa epoca em parceria com Hermínio Bello de Carvalho escreveu “Fale Baixinho”, sendo musica finalista num festival de canção. A partir daí passa a ter uma vida menos agitada, se retirando da vida noturna, para cada vez mais raras apresentações.
Em 1971, Dona Betinha passa mal e é internada, e dois dias depois, ele acaba sofrendo com problemas cardíacos e também vai para o mesmo hospital. Para não deixar a esposa preocupada, finge não estar hospitalizado, veste uma boa roupa, terno e chapéu e com flores nas mãos vai visitá-la. O Hospital em questão é o IASERJ. A farsa era combinada com o filho, Alfredinho e por acontecer no horário de visita do estabelecimento de saúde, ela não percebia. Ou fingia não saber. Vinicius sabendo do fato disse que não fosse ele mesmo, queria ser Pixinguinha.
Mas o problema de saúde da dona Betinha, era sério. No dia 7 de junho de 1972, aos 72 anos, era morreu. Ele foi brutalmente afetado pelo fato. Meses depois, em fevereiro, durante o carnaval de 1973, Pixinguinha foi a Igreja de Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, batizar o neto Oscar Rodrigo. Enquanto conversava com os amigos presentes, passou as sentir dificuldade respiratória. Era um novo enfarte. Seu filho, Alfredinho, ainda tentou leva-lo até a sacristia para que pudesse repousar a tempo de alguém encontrar um médico para pronto atendimento.
Lamentavelmente ás dezesseis horas e trinta minutos do dia 17 de fevereiro de 1973, ali mesmo na sacristia, aos 74 anos, nos deixava o grande Pixinguinha. Ele mesmo não esperava a morte, pois previa viver até os 80 anos, mas não foi possível.
Era carnaval e a Banda de Ipanema, que se preparava para uma apresentação, avisada do fato, parou. Não havia clima para festa. Partiu o Batuta, o menino bom, chegando ao céu, não ao som das harpas. Nesse dia, Deus fez exceção – pediu que os anjos tocassem flautas e saxofone. Há quem jure que a partir desse dia, os grandes músicos brasileiros ao morrer, são recepcionados por ele, com seu sorriso fácil e bom humor eterno.
Deixou além de Vinicius, muitos fãs, Tom Jobim, Chico Buarque, Caetano Veloso, Edu Lobo, Baden Powell, Paulinha da Viola e até m vida Sabotage, rapper, se inspirava nele. Jacob do Bandolim – um dos maiores bandolinista brasileiro - dois dias antes de morrer, 1969, visitou Pixinguinha. Disse que fazia aquilo para pedir a benção a seu santo.
Tinha ainda entre seus admiradores ilustres intelectuais como Sergio Buarque de Hollanda, Rui Barbosa e Mário de Andrade que no livro Macunaíma criou um personagem especial para o musico na historia – “um negão filho de Ogum Bexiguento fadista de profissão. Isso em 1926.

segunda-feira, julho 11, 2005

LUIZA MAHIN – LIDER DA REVOLTA DOS MALÊS


Imagem ilustrativa de Luíza Mahin

Todos os que lêem sobre a vida de Luis Gama são informados sobre a existência de Luíza Mahin – sua mãe, mas sua descrição é escassa, despertando assim a curiosidade dessa africana de etnia mina-jeje que participou de uma das maiores rebeliões negras e muçulmanas – a Revolta dos Malês, em 1835.
Sobre o ano de nascimento de Luíza Mahin, não da para definir. Ela teria vindo para o Brasil, embarcada no Forte de El-Mina ou São Jorge da Mina, localizado no antigo reino de Daomé. Os escravizados enviados por lá são em geral prisioneiros de guerra ou capturados na região de “Biad-Es-Sudan” – em grande maioria praticantes do Islamismo. Outro dado interessante é que Mahin do sobrenome dela, na verdade é referencial a sua descendência da etnia mahi – povo ioruba, também de Daomé. E outra informação não confirmada é que ela pudesse ser uma princesa, por isso o grau de formação política.
A discrição física de Luiza Mahin é comum em qualquer fonte de informação: negra, baixa, magra e bonita; de personalidade forte, solidária, mas um tanto sofrida. Profissionalmente era vendedora de quitutes e teria obtido a liberdade em 1812. Essa data é colocada com referencia de seu nascimento, mas sem documentos oficiais para confirmação.
Religiosamente Luíza era muçulmana, se negando a ser submetidas aos ritos católicos sistematicamente. Era letrada em árabe e lia o Alcorão, sendo inclusive responsável pela disseminação das palavras do profeta Maomé aos negros não convertidos.
Unida com um grupo de mais de 600 pessoas participou da organização da frustrada Revolta dos Malês, de 1835. Na madrugada no dia 25 de janeiro, após meses de arregimentação e planejamento, pretendiam instalar em Salvador um governo teocrático inspirado no Islã. O evento tem motivação nas Jihads – guerras santas – que simultaneamente na África, visando a destituição de governantes coniventes com a Escravidão e no ponto de vista islâmico, infiéis.
A estratégia ruim como um castelo de cartas, ao ser delatado ou relatado por Guilhermina. Outro personagem polêmico: há quem diga que ela fez isso sob tortura, outros que ela teria procurado o marido que sendo um dos participantes da organização, se ausentava sempre a noite – despertando seu ciúme; e outros ainda dizem que ela teria procurado o juiz de paz de Salvador, pois devia favores a ele e de posse da informação, foi retribuir. E uma nova versão responsabiliza um marceneiro afro-brasileiro de ter denunciado o grupo.
Enfim: mas os historiadores são unânimes em dizer que a Revolta dos Malês seria fatalmente derrotada pois não contava com apoio de toda população negra, pois os organizadores buscaram apenas os convertidos ao Islã e determinadas etnias africanas. Os excluídos, temerosos de um governo negro, mas islâmico, imaginaram que seria inclusive perseguidos pelos vitoriosos pela adesão ao catolicismo ou as religiões de matriz africana.
O certo é que Luíza Mahin foi surpreendida com seu grupo pela força policial, e obrigados a se lançarem em combate sem o elemento surpresa, foram derrotados. Ela e outras lideranças conseguiram escapar da perseguição, partiu para o Rio de Janeiro, deixando Luis Gama, com apenas 5 anos, aos cuidados de seu pai verdadeiro.
O destino de Luíza Mahin é apenas sugerido. Há rumores que tenha participado de outros movimentos de insurreição na capital do Império e que dessa vez capturada, foi detida e deportada para África. O próprio Luis Gama tentou por toda vida ter informações do destino de sua mãe, mas sem sucesso.


sexta-feira, julho 08, 2005

DITADURAS, NEGROS E LUTA PELA DEMOCRACIA

Na pesquisa sobre a biografia de Abdias do Nascimento, percebi que ele foi perseguido por duas ditaduras: a de Vargas e a do Regime Militar. Isso contradiz a imagem divulgada dos movimentos contra o Regime de Exceção, onde vemos nas fotos apenas Luiz Travasso, Wladimir Palmeiras e Zé Dirceu – como lideres estudantis. Perguntei-me: será que o povo negro assistiu como dizia o velho escritor: a tudo bestificado? Não teve jeito: novamente fui investigar.
No resultado dessa busca descobri que existiram sim, muitos militantes negros que participaram inclusive dos grupos de guerrilha urbana ou rural. Mas as formações preconceituosas dos nossos historiadores não fizeram o perfeito registro. Eles estão lá, presos, torturados, mortos e desaparecidos, entretanto apenas as pessoas oriundas da classe media são divulgadas como vitimas.
CARLOS MARIGUELLA

Carlos Marighella – negro assumido!
Uma das figuras mais fascinante desse período é a de Carlos Marighela, militante comunista, deputado e guerrilheiro, morto pelas forças de repressão em 1969. O fato está sendo resgatado no filme ainda em fase de filmagem”batismo de Sangue” – baseado no livro homônimo de Frei Beto.
Marighela nasceu em Salvador, no dia 5 de dezembro de 1911, filho do operário italiano, Augusto Marighela, nascido em Ferrara, Itália. A mãe, Maria Rita, era descendente de negros haussás. Ele nasceu num sobrado na Baixa do Sapateiro e seu pai era adepto do anarquismo – típico do inicio do século 20 e atendo a formação intelectual do filho, sempre comprava livros para que ele se instruísse.
Para orgulho dos pais, em 1931, Carlinhos – apelido de infância, ingressa na Escola Politécnica da Bahia, com a intenção de se formar em engenheiro civil. Mas o clima efervescente de 1932, quando São Paulo lidera um movimento constitucionalista contra o autoritarismo de Getulio Vargas. Ele organiza e participa de uma manifestação, mas Juracy Magalhães – interventor no governo da Bahia - fiel aliado do Vargas, ordem à detenção do jovem Marighela. O ato foi apenas um estopim para jogá-lo de vez na militância política, onde acaba abraçando a Juventude Comunista de Salvador.
Nesse meio tempo, em 1935, com a liderança de Luis Carlos Prestes, o PCB organiza a Aliança Nacional Libertadora e articula uma revolução brasileira. A Aliança tem forte adesão nacional com 1.6000 núcleos espalhados pelo território e milhares de filiados. O programa da ANL era basicamente, reforma agrária, nacionalização das empresas estrangeiras, liberdade e um governo popular e revolucionário. Mas no dia 11 de julho a ANL foi colocada na ilegalidade por Getulio.
Diante da reação de Vargas, numa estratégia mal planejada, no dia 23 de novembro de 35, foi deflagrada a revolução brasileira, com adesão dos soldados do 23º Batalhão de Caçadores. No dia seguinte ocorre a adesão dos militantes no Recife e quatro dias depois o 3º Regimento de Infantaria e a Escola de Aviação, no Rio de Janeiro. Mas a falta de apoio da população, vital para uma revolução, foi fatal e as forças leais ao governo conseguiram controlar a situação efetuando dezenas de prisões.
A fracassada revolução desencadeou uma operação de perseguição política da forças armadas, que tinham como objetivo principal a prisão e morte de Luis Carlos Prestes. E isso acontece, quando o líder comunista foi detido com sua companheira, a alemã Olga Benário. Ela também judia, foi mesmo grávida, enviada para um campo de concentração nazista. Há quem aposte que isso foi um presente de Vargas para Hitler, com quem cortejada, antes de se aliar aos americanos.
Nesse clima perigoso, com 25 anos, Marighela aceita uma missão de risco, reorganizar o PCB no Rio de Janeiro, sendo responsável pelo setor gráfico. Mas a repressão não estava brincando: no dia 1 de maio, dia dos trabalhadores, Marighela é preso e torturado, numa operação coordenada pelo temido Fillinto Muller. Mesmo sob fortes sessões de tortura, Carlos se mostra um grande militante e não revela nem nomes e nem lugares.
Tido pelas autoridades policiais como apenas um jovem comunista, Marighela é solto, em 1937, e recebe a missão de sair de circulação no Rio e partir para ação em São Paulo, com o mesmo objetivo anterior: rearticular o PCB. Mas sua tarefa é interrompida em 39, quando é novamente preso. O fato acontece em maio, na Rua Abolição nº.: 300 bairro – Bexiga, sob o disfarce de nome Armando Silveira Lopes. Reincidente, Carlos é submetido ao parcial Tribunal de Segurança Nacional e cumpre penas por seis antes entre os presídios de Fernando de Noronha e Ilha Grande.
Nos presídios, Marighela ajuda em cursos de formação dos detentos. Na Ilha Grande convive com militantes como David Capistrano e Joaquim Câmara Ferreira. Em Fernando de Noronha seus companheiros são Gregório Bezerra e Agildo Barata. Segundo relato de Noé Gertel, jornalista, “Marighela era um líder na cadeia, tinha um grande prestigio, muito carisma, sendo fundamental para vida intelectual dos comunistas e dos aliancistas”.
Mas a Ditadura Vargas não dura para sempre, sendo derrubada , no dia 29 de outubro de 1945, num golpe militar comandado pelo general Góis Monteiro. Duas semanas depois o PCB consegue sair da ilegalidade e obtém como partido político. Não demora a ser articular e conseguir nas eleições constituintes uma bancada considerável: elege para o Senado Federal, Luis Carlos Prestes; para a Câmara Federal 14 deputados federais, entre eles Marighella e obtém 46 vagas nas assembléias legislativas espalhadas pelo Brasil.
Além disso, nas eleições para presidente, o PCB lança Yedo Fiúza como candidato a presidente, que obtém 10% dos votos. O Partidão chega ao auge com mais de 150 mil filiados.
Com 34 anos, eleito deputado federal, Marighella exerce um mandato popular, fazendo defesa do aumento do salário mínimo, reforma agrária, ampliação dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, divorcio, ensino laico nas escolas, o casamento civil, sem a interferência da Igreja Católica. Pioneira é sua defesa da liberdade de culto no Brasil, onde adeptos do candomblé são perseguidos e terreiros fechados sob ordem policial. Mas ainda mantém a linha do PCB em criticas ao Império Norte Americano, chamando para si atenção dos anticomunistas.
Mas esse período de liberdade política, dura pouco. O presidente Dutra acaba aderindo a Política Externa dos Estados Unidos e o país passa a viver sob o clima da guerra fria. Conseqüência: o PCB, em maio de 1947, perde seu registro legal, sendo seus jornais, editoras e gráficas empastelados e fechados. A Confederação Geral dos Trabalhadores é lacrada e diversos sindicatos sofrem a intervenção com suas diretorias democraticamente eleitas, destituídas. Ainda seguindo as orientações de Washington, as relações diplomáticas entre Brasil e União Soviética são rompidas. Por fim, em 1948, dia 10 de janeiro, os mandatos dos deputados e do senador Luis Carlos Prestes são sumariamente cassados.
Nesse cenário, Carlos não tem a menor duvida, vai para a clandestinidade, pois percebe que não há mais regime político livre para fazer política. Mas não deixam de atuar: iniciam uma campanha pela “libertação Nacional” do país sob as ordens americanas, lançando o Manifesto de Agosto.
Nas eleições de 1950, o PCB assume a campanha eleitoral de Getulio Vargas, por acreditar que ele representasse mais os ideais nacionalista e favorável à estatização das indústrias e bancos. Marighella inclusive participa da campanha pelo monopólio do petróleo.
Como dirigente partidário, Carlos tem a oportunidade de conhecer em viagens entre 1952 e 53, a União Soviética e a China, paises comunistas, mas o PCB toma um choque ao XX Congresso do PC da Rússia, que em 1956 divulga os crimes cometidos por Josef Stalin, até então um ícone comunista. Isso se repercute no V Congresso do PCB, quando o partido abandona a estratégia de concepções insurrecionais e passa a acreditar na união com as forças progressistas do país.
Entretanto – a nova linha do PCB, não agrada a todos. Um deles é Marighella que aponta Cuba como exemplo de luta. Em 1959, o advogado Fidel Castro e o medico Ernesto Guevara lideram a revolução armada cubana. No Brasil formam-se comitês de solidariedade e em março de 1963, Carlos discursa em Niterói, no Congresso de Solidariedade ao Povo Cubano reforçando sua idéia de que o Brasil deveria seguir o mesmo caminho, inclusive com rompimento com os Estados Unidos.
O medo de que as palavras de Marighella e outros militantes políticos se se torna realidade, faz com que os norte-americanos patrocinem e supervisionem o Golpe Militar de 1964, que retira do poder João Goulart – presidente acusado inclusive de ser simpático aos comunistas. O Golpe acontece na madrugada do dia 1 de abril, mas os militares brasileiros, optam como data oficial pelo dia 31 de março. O dia seguinte era conhecido popularmente como dia da mentira - desonroso para seus interesses.
Na demora uma lista de dirigentes comunistas é enviada as forças policiais que passa a deter a qualquer custo os indiciados. Marighella é surpreendido no dia 9 de maio daquele ano. É o período da tarde, e opta por ir ao cinema para assistir no cinema o filme Rififi no Safári. A historia do filme sem censura ou conotação política e ele vai ver para distrair-se das preocupações já freqüentes com os rumos do governo ditatorial.
Informados de seu destino, após longa campana, agentes do DOPS o localizam e vão em sua direção. Mas Marighella percebe nos olhos dos homens que a intenção não é levá-lo vivo, na sala de exibição, mesmo cheio de testemunhas, os agentes disparam contra ele, a queima roupa. O publico entra em pânico. O líder comunista luta com os policiais, até ser desacordado com um golpe na nuca.
Carlos passa aproximadamente 3 meses detido e solto através de um hábeas corpus obtido após pressão popular. Imediatamente vai às redações dos jornais denuncia a forma brutal de sua prisão, que na verdade, era para ser um assassinato. Ele narra o fato no livro escrito depois “Porque Resisti a Prisão”. Após analisa que é melhor cair de vez na clandestinidade, pois está marcado para morrer.
Apesar do clima de perseguição política, o PCB, parece ainda acreditar nas forças progressistas e na derrubada da ditadura lenta e gradual. Porém a situação se mostra outra e Carlos, no dia 10 de dezembro de 1966, rompe com a Comissão Executiva do partido, lançando sua proposta de adesão à revolução armada, através da guerrilha urbana, demitindo-se da Comissão Executiva do partido.
Cuba, fonte da inspiração de luta de Carlos, o abria, onde lá participa de encontros e aulas onde toma noções de táticas de guerrilha. No dia 31 de julho de 1967, durante a Conferencia da Organização Latino-Americana de Solidariedade onde se declara publicamente a favor da guerrilha para derrubar os governos militares ou conservadores da América. Mas em setembro desse ano é expulso do PCB por discordar das posições da Executiva.
Em dezembro de 1967 regressa ao Brasil e em fevereiro do ano seguinte passa a recrutar ex-membros do PCB para sua nova organização. As ações de Marighella tomam forma através da Ação Libertadora Nacional, formado com integrantes dissidentes do PCB. Outros grupos também de formam: Movimento Revolucionário 8 de Outubro MR-8, Partido Comunista Brasileiro Revolucionário PCBR e a Vanguarda Popular Revolucionária VPR.
Percebendo as intenções dos grupos, o Governo Militar passa a endurecer o regime e a seguir os passos de Marighella. A preocupação dos repressores é materializada na capa da revista Veja, edição – 10 de novembro de 1968. Na capa é estampada à foto de Marighella com a legenda: “Procura-se” idêntico aos divulgados nos filmes de velho Oeste. É descrito como: Chefe Comunista critico de futebol em Copacabana, fã de cantadores de feira, assaltante de bancos, guerrilheiro, grande apreciador de batidas de limão.
No dia 13 de dezembro daquele mesmo ano, o general e presidente Costa e Silva, cede às pressões da ala linha dura do Regime Militar e decreta o Ato Institucional Numero 5, dando plenos poderes as forças repressivas e anulando dos direitos individuais da população. A partir daquele momento, qualquer um poderia ser preso, interrogado, a qualquer momento, em qualquer momento. Tradução: multiplicam as torturas e desaparecimentos.
Assim como previa Marighella, não havia o PCB é desmantelado na frágil articulação que ainda sobrevivia sob regime ditatorial com dirigentes presos, torturados e mortos. Em junho de 69, lança o mini manual do guerrilheiro urbano, até hoje copiado por organizações de esquerda. No dia 15 de agosto numa atitude ousada invade os transmissores da Radio Nacional em Piraporinha, estado de São Paulo, e coloca no ar um manifesto contra o regime militar.
O contra-ataque foi executado no dia 4 de setembro de 1969. MR-8 e ALN planejam e empreendem um seqüestro político. A vitima não é qualquer uma: é o embaixador norte-americano Charles Elbrick. A motivação é dar um recado aos Estados Unidos e humilhar os militares frente aos americanos, demonstrando sua incompetência na manutenção do domínio do país e em dar segurança aos interesses ianques.
Nessa ação friamente planejada, se via a mão de Marighella que desmontando a imagem de simples bandido, divulgada pela mídia, pede como resgate uma lista de 15 presos políticos, mantidos sob tortura. Entre eles, nomes que hoje estão na política: José Dirceu e Wladimir Palmeiras – hoje no PT e na época no Movimento Estudantil.
A exigência foi cumprida e os presos foram embarcados para o Chile e só depois o embaixador americano, totalmente atordoado, foi liberado.
O vexame que foi submetido o regime motivou o desejo de vingança contra Carlos. Se antes queriam matá-lo, agora desejavam trucida-lo, dando lhe uma morte exemplar para todos os que se opusessem aos ditadores.
Marighella ciente do perigo que passava, recobre de cuidados seus passos e não dorme no mesmo lugar nunca. Ainda dá tempo de dar entrevista a um jornal francês – o Front, anunciando o Brasil como o Novo Vietnam – comparando a resistência camponesa dos vietnamitas às tropas americanas. É sua ultima entrevista. Ainda tenta articular um grupo de guerrilha rural, devido às dificuldades das atividades nas cidades, muito vigiadas.
61 dias após o seqüestro do embaixador americano, numa terça feira, dia 4 de novembro – dois dias após a comemoração de finados – Marighella é emboscado. A operação é planejada nos mínimos detalhes, pelo temido delegado Sergio Fleury.
A hora e local onde estaria Carlos, é dado sob efeitos de brutal tortura. No horário marcado, trocaria informações com os freis Ivo e Fernando, na Alameda Casa Branca, em São Paulo. Seria na altura da residência de numero 806. Os religiosos já previamente torturados estavam no local, como planejados, servindo de isca para o líder comunista.
Carlos chega a Alameda Casa Branca, confiante nos cuidados dos freis com a perseguição política. Ao olhar para o rosto dos religiosos percebe algo de diferente. Não estão tranqüilos. Experiente, percorre com os olhos a redondeza e constata: estou numa emboscada. 29 agentes lhe cercam.
Sem poder expressar qualquer reação é fuzilado ao caminha para seu carro. A cena é cinematográfica. Ao tentar-se abrigar dentro do veiculo, é atingido por uma bala que atinge as nádegas e transpassa. O segundo tiro pega a virilha, o terceiro passa raspando pelo rosto. No chão, sangrando muito, é cercado. Eleva a mão num ato de defesa, mas um dos dedos é destruído num disparo a queima roupa que acerta o pulmão e a aorta. O ferimento é fatal e ele morre instantaneamente.
Mesmo morto Marighella é temido. Seu sepultamento no cemitério da Vila Formosa, em São Paulo, tem como testemunha 15 agentes do DOPS, armados com metralhadoras, no temor que seus companheiros pudessem resgatar seu corpo.
Sua situação de combatente contra as ditaduras militares só foi reconhecido pelo Governo Federal do Brasil, em 1996.

OSVALDÃO – GUERRILHEIRO DO ARAGUAI


Oswaldo Orlando da Costa – o Oswaldão é outro afro brasileiro que participou ativamente na luta contra a Ditadura Militar. Mineiro de Passa Quatro, fez engenharia na Republica Comunista da Checoslováquia. Consegue esse beneficio por ser integrante do Partido Comunista do Brasil.
Termina seu curso em pleno Governo Militar, e ao retornar em território nacional, tem consciência de sua situação política e cai na clandestinidade por dois anos, até ser designado pelo PCB a integrar como a Guerrilha do Araguaia – dado seus conhecimentos técnicos – e como um dos comandantes.
Sua patente é também devido seu treinamento militar, obtido no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva.
Mal equipados e em menor numero, os integrantes da guerrilha, foram presos, torturados e mortos. Em revelações de antigos militares, dão como certa a morte de Oswaldão e a ocultação de seu corpo. Recentemente em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, um ex-soldado do Exercito, afirma que Oswaldo foi muito torturado, antes de morrer. Todos os depoimentos coincidem num ponto: sua morte ocorreu em 1974.

ESMERALDO TARQUINIO - CASSADO PELA DITADURA

Vários políticos foram cassados pelo regime militar. Dentre eles havia um negro: o advogado Esmeraldo Tarquínio de Campos Filho. Nasceu em São Vicente, no dia 12 de abril de 1927.
Foi deputado estadual em 1967 e depois prefeito de Santos. Mas em 1969, ele é perseguido por políticos ligados ao governo militar e tem seus direitos políticos cassados por 10 anos.
Mas nem esse tempo conseguiu apagar sua liderança política. Em 1979 obtém o mandato de deputado estadual na Assembléia Legislativa e pela força do voto, retorna o mandato de prefeito de Santos. Entretanto, no dia 10 de abril de 1982, sofre um aneurisma cerebral.
Há quem diga que se continuasse vivo, teria Esmeraldo teria se tornado uma das maiores lideranças negras na política.

CONCLUSÕES
Com certeza há mais que esses três exemplos citados de participação afro brasileira na luta contra a Ditadura Militar, mas há poucas pesquisas.
Em conversa com a professora Maria Regina Sader, ela disse que se lembra que havia mais negros na militância, inclusive recorda ter visto alguns no exílio. Ela é professora de Geografia da USP e mulher de Eder Sader.
No futuro com mais tempo, pretendo descobrir quem foram eles para recuperar essa situação que é importante inclusive para a auto estima de nosso novo.

Marco Antonio dos Santos, membro do Conselho Estadual de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra de São Paulo.

quinta-feira, julho 07, 2005

A LUA ME DISSE: LATOYA E WHITNEY


EU SOU NEGUINHA?
A mais nova polêmica nos meios de comunicação é a novela A Lua Me Disse, escrita pelo talentoso Miguel Falabela. O que tem gerado mais discussões são os papeis das atrizes Zezeh Barbosa e Mary Sheila, que vivem na telinha as irmãs Anastácia e Jurema e abominam os nomes de batismo e suas características negras. Elas se auto denominam de Latoya e Whitney. Um dos exemplos sempre usados é de Michael Jackson, que após inúmeras cirurgias plásticas e tratamentos de peles deixou de parecer afro americano. O humor de Falabela é inteligente, mas é necessário tomar cuidado para não aumentar o preconceito com isso.
O desejo das duas personagens em se tornarem brancas é verdadeiro em paises africanos onde as jovens usam cremes ou sabonetes que contém mercúrio e hidroquinona – produtos químicos que podem danificam a pele, e são indicados restritamente a pessoas portadoras de manchas. Nunca podem ser usados sem orientação de um dermatologista. O mesmo acontece com os cabelos onde às vezes produtos tóxicos são usados para alisamento numa aproximação involuntária do padrão de beleza europeu.
Mas nada disso é por acaso: os sociólogos Florestan Fernandes e Roger Bastide já constataram no livro Brancos e Negros em São Paulo, obra de 1959, que a cor de pele e o cabelo são usados como itens de classificação étnica. E o afro brasileiro ciente disso, carregado do conceito de que apenas o nariz e lábios finos, além de cabelos lisos são significados de beleza - tenta se alterar.
Entretanto o fato não é culpa da população negra – ela está nos meios de comunicação onde são disseminados os padrões de beleza. Nas propagandas, novelas e filmes e até na musica – os dotes elogiados são brancos. Recordemos Luis Caldas com os versos “ negra do cabelo duro, que não gosta de pentear” ou Ari Barroso com “ o teu cabelo não nega mulata, pois é mulata na cor, mas como a cor não pega mulata, mulata, quero seu amor”. Além de um fundo machista as canções são exemplos de depreciação das afro-descendentes.
Isso tudo é fruto de um modelo de educação. Por exemplo, na antiga cartilha de alfabetização “Caminho Suave” a ilustração de capa eram de um menino branco de cabelos pretos e uma menina branca loura. Mesmo dentro dela não havia um desenho sequer mostrando a diversidade racial do país: não vemos indígenas, negros, japoneses ou judeus. Intencional ou não o material didático aumenta o preconceito.
Miguel Falabela é conhecido por cutucar a sociedade com seu humor caustico nos preconceitos da elite brasileira. Quem não se lembra das frases sobre pobres do personagem Caco Amtibes do programa Sai de Baixo. Mas assim como foi no passado e está sendo no caso das personagens Anastácia e Jurema, há de se tomar um certo cuidado. O nível das piadas é inteligente, mas num grau elevado demais para o povo brasileiro a quem não foi ainda oferecido no ensino o certo ou errado na questão racial. Resultado: há negras revoltadas com as falas da novela e brancas dando risada sem reflexão. Tomara que os dois grupos acompanhem o folhetim eletrônico até o fim pra saborear a moral da história.
Enfim beleza é algo universal e não uniforme. Brancas podem encarolar os cabelos e negras alisarem, desde que isso seja a adoção voluntária de um novo visual e não a ditadura de padrões de beleza, que não respeitam as belas diferenças.
Ah... um detalhe: a novela Alma Gêmea – outra polêmica. Priscila Fantin é linda, mas não tem nem traços indígenas. Será que não existe uma atriz de etnia indígena no país? Por exemplo, Dirá Paes que trabalha como coadjante no programa humorístico A Diarista?

MIGUEL FALABELA